quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

O SEXO NO PERÍODO PRÉ-COLOMBIANO


A arte erótica encontrada em tumbas pré-colombiana no Peru revela retratos intrigantes de culturas anteriores à civilização dos incas - e uma visão singular sobre a morte e o sexo.  Tais vestígios arqueológicos expostos no Museu Larco recuam até 8.000 a.C.

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Seja nas sociedades maias ou astecas do México, ou entre os incas do Peru, há poucos registros sobre a vida sexual na época pré-colombiana. Essa é uma das razões do interesse pela rara coleção de arte erótica do Museu Rafael Lar co Herrera, que funciona em num palacete do século 18, em Lima, e reúne mais de 45 mil objetos. Ao chegar ao museu, os turistas descobrem que o sexo é apenas um dos temas intrigantes de civilizações com mais de cinco mil anos de história.
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 artefato com mulher fazendo felação (sexo oral) no homem. (200 a.C - 200 d. C) 
Reinaugurado em setembro de 2010, depois de uma criteriosa reforma, o museu exibe peças em estantes fechadas por vidros, catalogadas por época e por cultura, recuando até 8.000 a.C.. tecidos, cerâmicas, vasos, flechas, estátuas, joias e objetos de ouro e de prata. Os detalhes arquitetônicos do prédio chamam atenção, como a pedra da soleira das portas e o piso de madeira antiga das áreas de exposição, que dialogam com as peças e revelam que o museu é a casa de um colecionador aberta ao público. Construída sobre uma pirâmide pré-colombiana do século 7, a propriedade foi comprada já com o intuito de expor o acervo privado de um dos pioneiros da arqueologia peruana, Rafael Larco Hoyle.
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Garrafa da cultura virú (200 a.C - 200 d.C). Homem e mulher transando. 
Nascido no Vale de Chicama, perto da cidade de Trujillo, Larco Hoyle passou a vida colecionando vestígios de civilizações passadas no norte do país. Para homenagear seu pai, Rafel Larco Herrera, que também promovia a arqueologia peruana, Hoyle fundou o museu em 1926, na fazenda da família, em Chiclin, e mais tarde o transferiu para o palacete de Lima.
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Garrafa da cultura salinar (200 a. C - 200 d. C) Mulher acaricia o órgão sexual masculino. 
As 45 mil peças reunidas integram uma espécie de livro dos mortos pré-colombiano. Quase todas foram encontradas em tumbas e estão ligadas a práticas funerárias e de sacrifício. Cada uma à sua maneira, seja pela forma, pelo material ou pelos desenhos, conta algo sobre as culturas ancestrais da região. Uma ânfora de cerâmica, por exemplo, revela hipóteses sobre a guerra, o poder dos xamãs e as divindades.
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Vaso mochica (100 a.C - 800 d.C) Mortos com pênis ereto, uma alusão à continuidade da potência dos ancestrais. 
Nos desenhos, há profusão de imagens sobre o sacrifício humano, que não abatia apenas os vencidos, mas também caía sobre mulheres e crianças, cujo coração era retirado. A oferenda aos deuses visava manter o mundo em equilíbrio. Sacerdotes e xamãs, intermediários entre a sociedade dos vivos e os outros mundos, exibem peles, plumas e objetos rituais ligados à ingestão de substâncias alucinógenas, usadas desde 1.500 a.C.
Artefatos com casais fazendo sexo. (500 a. C- 500 d. C)
Quando se fala em civilizações pré-colombianas peruanas, pensa-se logo nos incas. "O equívoco acontece sempre", diz a arqueóloga Ulla Holmquist, curadora do museu. O império incaico durou apenas um século, mas marcou a história porque era a cultura dominante que os espanhóis encontraram ao se instalarem no Peru no século 16. "Os incas duraram três ou quatro gerações, enquanto a presença humana no país tem mais de dez mil anos. A domesticação dos animais e a agricultura começaram em 7.000 a.C. As sociedades sedentárias se consolidaram entre 3.000 a.C. e 2.500 a.C. Portanto, é uma história bem mais longa."
Artefato com mulher tendo um parto (300 a.C - 300 d. C) 
A mais antiga sociedade do Peru foi a civilização caral, que floresceu ao longo da costa do Pacífico entre 3.000 a.C. e 1.800 a.C. Há indícios de presença humana recuando até 10.500 a.C. Depois da cultura caral, há camadas de culturas arqueológicas distintas: cupisnique, salinar, chavin, paracas, virú, mochica, nazca, huari, lambayeque e chimu. Só depois dos chimus vieram os incas que criaram um Estado baseado na agricultura em terraços, irrigação, pecuária de lhamas e vicunhas e pesca - uma sociedade sem mercado nem dinheiro.
Garrafa com casal mantando relações sexuais. (500 a. C - 200 a. C)
Em 1524, a varíola, introduzida a partir do Panamá, devastou o império antecipando a conquista empreendida por Francisco Pizarro, que derrotou e executou o Sapa Inca Atahualpa, em 1532. Dez anos depois, a coroa espanhola estabeleceu o vice-reinado do Peru controlando todas suas colônias na América do Sul. O ouro e a prata inca atraíram a cobiça dos espanhóis que conquistaram o Peru em 1532. Vasos, cerâmicas, estátuas, joias, tecidos e flechas, num total de 45 mil objetos oferecem um panorama das civilizações pré-colombianas.
Mulher fazendo felação no homem. 
Mortos-vivos
Holmquist ressalta que a arte erótica é apenas uma das manifestações vitais da arte pré-colombiana. Muitas culturas dividiam a vida entre o mundo dos vivos e o dos mortos, um exterior e outro interior, invisível. "Achar que aqui temos uma espécie de Kama Sutra pré-colombiano revela a nossa visão ocidental a do sexo e não a de pessoas que viviam em outra época com conceitos diversos."
Muitas cenas retratadas remetem à sociedade dos mortos. A maior parte dos objetos pertence à cultura mochica, que colonizou os vales do Norte, entre 300 a.C. e o ano 1.000. Os mochicas não chegaram a constituir um Estado ou uma unidade política que integrasse os centros populacionais, apesar da extensão da sua civilização e do tempo que perduraram. Para eles, os ancestrais seguiam fertilizando a terra e assegurando a continuidade do ciclo produtivo,no mundo invisível no qual viviam após a morte. Aí continuavam a cantar, a dançar e a manter relações sexuais. Muitas cenas mostram práticas sexuais tradicionais como masturbação e felação. Segundo os antropólogos, os mortos expeliam sêmen, embora a fecundação não fosse mais possível.
Garrafa mochica de Lima. (100 a.C. - 800 d.C.). 
"Os seres do passado são considerados seres sociais que possuem desejos", explica o antropólogo alemão Jürgen Golte, especialista na América andina. "Eles viviam conflitos, sentiam repugnância, atração, estabeleciam alianças, faziam oferendas, feriam, assaltavam e violavam. O cosmos sociomorfo era um cosmos de seres ativos." Para Golte, o sentido das imagens legadas não é de simples decifração. "O Kama Sutra dos andinos carece de um prazer expresso aparente. Mas isso não significa que eles não tivessem prazer", ressalta.
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Os vestígios arqueológicos expostos no Museu Larco recuam até 8.000 a .C. 
Fontes: Revista Planeta, dezembro de 2011.
Site do Museu. www.museolarco.org

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